2/02/2023

Chevra Kadisha

Teus olhos que me abriram buscando tal essência
reconhecida em velhas palavras de espírito,
do recôndito da alma ou eterna dissidência -
teus olhos duas Antares de força e conflito.

Atados pela carne ou pela decadência 
meus ossos encontraste em tudo que foi dito,
em tudo que se enterra por zelo ou influência
da urgência de ser único, mas indescrito.

E como julguei etérea, dessignificada
a origem destas ermas e incautas imagens
na oculta sordidez erguendo suas paragens!

Teus olhos que banharam essa terra ilhada,
afeitos ao meu corpo - comum subserviente
deste rito sagrado e contraproducente.

*

Eclesiastes 5:16

"Há também outro mal, assim esteja atento:
nossa nudez é igual na volta ou na partida,
que vale perseguir o rastro vão do vento
e entregar para o tempo os valores da vida?"



Toda palavra foi comprimida
dentro de uma sentença reduzida
a uma descrença desequilibrada,
toda letra foi lida e pronunciada,
tudo que é sonoro foi soado 
e o que se deu ao uso foi usado.
Toda tristeza é hereditária 
e essa saudade latifundiária
do que nunca foi verdadeiro e meu,
eu acho que nem mesmo aconteceu 
o anoso mistério que foi revelado 
do que era evidente e significado. 
Tudo que é dor é indiferente 
à delicadeza do amor contundente,
e o líquido amparo da alma é inútil,
nem mesmo a poesia pouco sutil
te diz o que é teu e então te conduz
a qualquer ímpeto de morte ou de luz.
E tudo regido pelo discernimento
se mistura e se funde ao conhecimento,
nada mais é firme aos pés cambaleantes 
e nem mesmo a jura eterna dos amantes
pode enfim traduzir da língua mais ufana
o horror de pertencer à espécie humana.