17.12.25

Selene

no céu vaga Selene
tão leve quanto clara, 
mas eu, oh, minha cara, 
não há quem desempene

ao ver-te, assim, perene 
com essa minha cara
na luz que me dispara
e faz de mim indene... 

Selene majestosa, 
a noite é verso e prosa
num livro de magia –

mas eu, oh, minha dama, 
sou voz que escreve um drama:
febril Melancolia... 

29.11.25

um romance noir

a cena em branco e preto;
silêncio e pausa lenta –
escrevo-te o soneto
que a nossa dor inventa... 

teu filme predileto, 
que entrega representa! 
cenário e som; projeto
que a nossa dor sustenta... 

nas sombras – madrugada –
fugimos pela estrada
do sonho e sobretudo

a chuva – triste acólita –
exausta, forte e insólita 
fechava o fim de tudo...

7.11.25

o espião na casa do amor

o amor é força motriz –
fonte de luz que transpasso,
o amor não é infeliz,
nem idolatra o fracasso,

o amor é aquilo que diz –
canta no tom, no compasso,
o amor é sempre um aprendiz 
tentando ter mais espaço,

tão mais humano esse amor
sobrevivente e senhor
da sua própria vontade...

que fez meu peito se abrir,
que vem dançar – conduzir,
que tem total liberdade...

21.10.25

controversa

se foi como chegou —
amor a duras penas,
tão bela nessas cenas
que a dor fotografou...

vive no que deixou
para morrer, apenas,
como febris falenas
que o fogo flamejou

pudera ouvir e crer?
te fiz me conhecer 
as vidas mil de outrora...

e agora, tristemente,
você me quer poente
e nunca mais aurora...

13.10.25

inconstante

esse Olhar periférico
que nos olha através 
de um reflexo esotérico;
esse Olhar sem viés 

que prolífero e feérico
revelou quem tu és;
esse Olhar imagético 
de Isis, de Nephthés;

esse Olhar que cativa
mesmo a quem se priva 
do socorro dos seus,

esse Olhar perigoso;
como um Sol curioso
sobre as obras de Deus!

27.9.25

tensão

em volta desta fonte,
quando a Noite se estender
e o Sol, cansado, descer
os muros do Horizonte,

estaremos defronte
e sem nos perceber
iremos nos conhecer,
cruzaremos a Ponte

e juntos, doutro lado,
não haverá tal cuidado
em levantar nossa voz,

mataremos no beijo
esse duplo Desejo —
essa Tensão entre nós...

20.9.25

livre arbítrio

não se escolhe nascer;
você nasce — e pronto
se declara o confronto,
se pretende viver...

não se escolhe pensar;
você pensa — tá feito,
já ficou sob efeito,
não se pode parar.

não se escolhe sentir;
quando viu — quer sorrir,
quer fluir e cantar.

não se escolhe querer,
e no mais — vai saber
quem se escolhe amar?

5.9.25

Stims XX

Conheço uma nova calma
deitado no chão —
alucino um mergulho em Gaia...

Apago por horas minha alma
numa condição;
que o coração não me traia.
 

2.9.25

XI

Adeus, Sol — nunca mais as lúdicas auroras... 
Adeus, Sol — belo, vivo, forte e bem disposto...
Adeus, Sol — sempre quase choro nessas horas...
Adeus, Sol — tudo sempre parte do suposto...

Adeus, Sol — leva minhas dores mais sonoras...
Adeus, Sol — bata em outro canto, em outro rosto...
Adeus, Sol — luz no riso triste das senhoras...
Adeus, Sol — faça um novo ninho, um novo posto...

Adeus, Sol — parte com teu divinal conceito!
Adeus, Sol — que esse estranho verso não tem jeito...
Adeus, Sol — que essa velha história se renova...

Adeus, Sol — livre, raro, e justo carmesim...
Adeus, Sol — dorme. Logo, logo, chega o fim...
Adeus, Sol —  (((     s  u  p  e  r  n  o  v  a       )))

15.8.25

Pâtissière

Para o aniversário de 40 anos da Cris 

Que bolo de beijinho delicado,
servido de equilíbrio e de dulçor.
Quando o mordo, no seu umidificado,
minha alma se enrubesce de pudor.

Minha alma, que me faz sentir amado,
teu bolo, que me toca de fervor,
os dois seguem no baile confeitado,
dançando aquela dança do sabor!...

Mastigo e não me farto, te larico,
repito e não reparto, te dedico
aos Céus nessa ternura de iguaria...

E o doce, quando acaba de repente,
me deixa algum demônio penitente
no inferno de amargar melancolia.

13.8.25

Relax

Pensar em ti somente e não dizer! 
repito para ser memorizado...
Silêncio... faço um verso cochichado
que quase some o som, que quer morrer...

Pensar em ti somente por prazer,
daquele bom prazer que é bem pensado —
que em tempo de partir quer nos prender,
que em tempo de prender tem libertado...

Pensar... isso somente... só isso basta?
Mas nada me responde e me devasta,
nem diz que estou errado, que vacilo...

Eu tento te deixar, eu me ameaço
e ponho o teu silêncio nesse traço —
e finjo ir dormir, assim... tranquilo...

12.8.25

Stims XIX

Ao mesmo tempo que me fascinam 
esses, que julgo serem o que são, 
fico boquiaberto
ao que os conduz 

a serem o que são, assim, sendo vistos 
nesse espelho social adulterado... 
é tão óbvio o sol 
para quem luz?

7.8.25

Para seus óculos

Voltaste para ler meu corpo inteiro
depois de me prender, de ser quem és...
E agora, que me deste paradeiro, 
mantendo-me pisado por teus pés?

E agora, que contei teu fevereiro,
embora dissidente, mais de dez...
Que importa a quantidade, se primeiro
a qualidade mostra o seu viés?

Que importa o dia do mês ou da semana
pra quem não fez, na vida, mais que os planos,
pra quem não quer saber que tudo engana –

quer sejam desprazeres quotidianos,
quer seja a mesma bossa, a mesma gana –
que importa, para nós, a luz dos anos?

5.8.25

Insolação

Que tenho, que essa febre não desiste?
Que alucino analemas no infinito
da sanha dos seus olhos e acredito 
no verão, que é verão porque pediste...

Que tenho, que confundo se resiste
a mesma febre estranha? Que esquisito —
não vou? — aceito — não quero? — permito —
não sei se é mesmo amor, se o amor existe...

Ah, céu! Por que não cai? Por que me luz
tão vivo, que mais vida reproduz 
em tudo que me fere e me aprisiona?

Ah, Sol! Talvez nem saibas que sou teu...
deixa estar — vai passar — aconteceu —
precisando, tomo outra Dipirona.

1.8.25

Trégua

São seis horas da noite, sexta-feira.
Depois de carburar um mato fino,
dei play no Spotify — tirei seu pino,
granada defensiva e verdadeira,

e aqui te segurei, nessa trincheira —
e nada de explodir nenhum destino,
e nada a reportar, nada sanguino,
e nada de cruzar uma fronteira!...

Já vamos para as oito. Vamos indo
sonhar teu despertar, dormir sorrindo,
meu coração culpado, que calor!

Ouvir teu disparar desafinado
tem sido um disparate delicado,
tem sido um desespero de dulçor!

25.7.25

Esperança

Existe alguma força compulsante
que pode me esmagar um sentimento?
Um rolo compressor, assim, gigante
que planifique a dor deste momento?

Amor? Quando a certeza é delirante 
e faz da voz o embargo mais sedento?
Amor? Quando a paixão é sufocante
e fez arfar meu peito descontento?

Eu tive poucas chances como agora 
e como agora o tempo, que me alcança,
revela que há bem mais, que mais vigora 

enquanto essa paixão perdura e avança —
tão crente que não posso ir embora, 
tão crente que já tive uma Esperança...

24.7.25

Voragens

Que faço se as voragens não me largam?
Reduto da paixão, quanto padeço 
e pago novamente um caro preço
por um papel de versos que te amargam...

Reduto da paixão, me dê teu preço,
um preço para os braços que te largam,
vitrine de sonetos que me amargam
no corte dos pedaços que padeço...

Bonito isso a dúvida, não vês
que tudo se repete ou contradiz
e volta a te dizer mais outra vez

e assim dizendo vai e não prediz
aquilo que produz no que tu vês,
que não dizendo diz o que te diz...

23.7.25

It's so cold

Abre, Inverno, seu corpo retinto,
desaba sobre o vale, romantiza
a tarde que mansinha vem, me pisa
que mais eu tremo, estalo e sinto 

e quebro retalhado, tanto instinto 
me ocorre transversal pela divisa 
e na espinha dorsal se cristaliza,
que a dor me fez melhor e mais distinto...

Rasga, Inverno Cálido, os instantes
que te conheci os olhos conflitantes 
da nova ambiguidade boreal,

que mais avanço e galgo, que te banco
nesse deserto estéril de tão branco,
tão branco quanto a Morte, quanto o Mal...

22.7.25

Flâneur

Há algo. Não durmo. Clico teu perfil,
aumento a foto, pego-me sorrindo
olhando o teu fitar, que me despiu
fitando assim estático, me abrindo 

tão lento e mais que lento, feminil  
e morno me tragando, um trago infindo,
magnético, morno, lento, vil —
itálico, disperso, longe, lindo,

e o nublo olhar me fala, conversamos
sem nos dizer palavra, nos tocamos 
em closes afrontosos e soturnos,

e o anjo olhar me rende, me remove,
embora eu nada tenha que lhe prove,
além de uns decassílabos laburnos...

21.7.25

A Justa

Se sabes, cara dama, deste vate
a quantos anda o pulso, que não meço,
que aqui não há limite, te confesso
que nada disto é amor, mas sim combate!

Contrário a me poupar de todo abate,
desnudo o elmo e a malha, me ofereço
sabendo ser lançado, te obedeço,
e mesmo que tal feito, então, me mate...

Servi-la, que servir é minha sina,
será, por mais complexa a toxina,
melhor que não te ver, não te escutar...

Não sabes como entendo essa fraqueza 
de ser mais desejada que a certeza 
de ter alguém pra quem se declarar...

19.7.25

Handroanthus Albus

Ou poemas dedicados ao Sol
 
Jamais direi, não mesmo. Se disser
do arrepio adocicado que provoca
a simples assonância da tua boca,
que diz-me tudo aquilo que se quer.

Não digo, e sem dizer nada sequer
lacuno uma certeza que me choca,
e o quadro que te beijo se desfoca
na lente do silêncio que é não ter.

Espero que desflore a primavera,
que agora furta cores de quimera
no lance que acontece — que castigo!

Que néctar de sol borboleteio!
Que febre, que luxúria, que tonteio!
Que nunca te direi, que te não digo...

18.7.25

Stims XVIII

Estou fadado ao feitiço 
de me ver no que saboreio 
e, pasme, tomar como indireta 
aquilo que, tonto, leio! 

E logo imagino o cenário 
em que alguém me põe no meio, 
pasmado e envaidecido 
daquilo que inventei, que creio... 

15.7.25

Stims XVII

Nem melancolia, nem destempero, nem medida
por algum fio... 
Divago ânsias em órbita do abismo mais denso 
de tão vazio... 

Cansei de maldizer o dia que vim a nascer... 
num maio frio  
o Outono a me balançar cantigas no berço —
num tom sombrio... 

13.7.25

O Programador

Acorda Deus, é sábado, vem para fora 
do cobertor Nirvana... presto, seja vivo! 
recola um retrô pôster bem figurativo
no Teu quarto de caos, de estática! Vambora! 

Põe Teus chinelos, verba a Voz, acende o Agora, 
flanela o curvo óculos definitivo, 
encontra em existir Teu cínico motivo, 
dichava Teu badego, vem Nossa Senhora!...

Pois liga o Teu PC que, singular, explode
num boot tão veloz, que distorcendo a luz
imagifica o Tudo com Seu hack mode, 

também vê Teus recados de orações em flux, 
enquanto clica a Terra, e pensa no bigode
do próximo avatar com nome de Jesus!...

5.7.25

Stims XVI

Queria alucinar outra loucura, 
que não esta, 
roubar a pedra mor da ventura 
de uma testa, 

praticar magia mais obscura, 
mais modesta... 
ser não mais que uma criatura 
da floresta... 

3.7.25

Stims XV

O verso que não fiz 
não me diz nada, 
se não fiz, não veio a ser 
e se não há pé, não há estrada.

O verso que te fiz? 
Foi desse jeito:
acordei, tomei café, banho, saí... 
depois voltei com dor no peito. 

19.6.25

Stims XIV

Posiciona-se intrusivo, velhaco, urticante, cínico,
estrategicamente nas quinas etéreas
onde me cai todo nexo, 

esse susto, esse sopro, esse topo, esse tapa
que derruba o número oito 
recurvando o som do sentido. 

18.6.25

Stims XIII

Mimético inveterado, 
imito aquilo me apraz
ou seja; um doido dado
àquilo que um doido faz, 

por esse meu repeteco 
que rapto, que confisco, 
que desdo australopiteco 
arranho parede e disco... 

8.6.25

À Manicure

Em teus ouvidos curam-se as carências
daquelas saturadas das cidades, 
curvando tua coluna, em penitências, 
recontas pelos dedos as idades

que marcam teus horários nas urgências
do teu convento móvel, soledades
que atendes cutilando confidências
distintas, mas iguais em densidades... 

Das cores? Vinte telas que matizas, 
não sem antes moldar em formas lisas;
quadradas, curvilíneas, estiletos 

da prática de antigas outras monjas, 
que herdaste, merecidas as lisonjas
que tingem os teus lindos olhos pretos! 

3.6.25

Manual do Minotauro

Manual do Minotauro  
 
E esse sonho de tiras da Laerte? 
que achado, nele tudo é bem servido... 
a novidade hermética que aperte 
o seu tronxo bolado bem lambido!

Transvó! Certa a poesia que te converte 
nesse teu traço tão desentupido, 
que do ácido me ferve teu "desperte" 
da droga que me faz ser comprimido. 

Eu não sei se ela tá careta agora, 
tanto faz qualé a fuga que vigora, 
só preciso escrever mais uma estrofe... 

E que mulher, que artista, que gogó! 
nem Moebios Madureira, seu xodó,
deixou tão belo e vasto estrogonofe! 

13.5.25

Stims XII

Toda semana vasculho
nessa estreita plataforma
não o poema, mas a poesia:
essa que não se conforma,

essa que, cosmopolita, 
pretende evocar e morrer, 
té penso ser melancolia 
o que a rigidez vem reger. 

4.4.25

Stims XI

Da sensação o tempo percorrido
de quando os átomos chocam 
no afeto prazeroso e mantido
onde os dedos curiosos tocam...

Das ondas de acordes dissonantes
que vibram cordas de tessitura, 
no sexo que nos esconde instantes - 
permanência rara de textura!... 

13.3.25

Stims X

Cataplat! Estouram estilhaços
de confetes palavrões confusos
do eu lírico - patrão desses palhaços
que não têm nenhum dos parafusos...

Granada! E lá vai bomba - aplaudem
ao me explodir de raiva, mas poética - 
Ora, Sol! Que teus raios me saúdem
no fim dessa atração patética! 

12.3.25

Jacaré

Flutua o trem, compassa
embora ninguém faça 
menção de perder fé, 
depois de Del Castilho 
retorna à casa o filho:
teus trilhos - Jacaré! 

No Jaca que eu cresci 
de tudo quase eu vi, 
mas sem xisnovear, né? 
Eu lembro de um vizinho 
que teve um fim sozinho... 
teu forno - Jacaré! 

Que boldo perfumado! 
Incenso que é tragado
no encanto do oboé,
na feira tem farinha,
tem pedra e barraquinha
de flor prensada até...

Na Bêra do rio verde
qualquer herói se perde, 
té mesmo Ivanhoé, 
se rende e nada vê
Ricardo não-sei-quê - 
Saudades, Jacaré! 

11.3.25

Stims IX

Saturno, o senhor tem fome?
Tal de Goya te postou na Espanha,
não te culpo, mamãe me consome
fritando minha carne na banha...

Sofres de fúria, ah! Sartuninho
girando anéis de grã deidade,
teu outro nome? Eu adivinho:
Ansiedade! Ansiedade! Ansiedade!

8.3.25

Stims VIII

Quando ouvi tua melodia, 
febril flauta em Hamelin, 
lentamente conduzia 
a criança dentro em mim... 

Baile das comorbidades
e dancei com depressão... 
................................................ 
daí que veio toda paixão!

6.3.25

Stims VII

Distraio minha dor intrusa
com outra dor - essa fácil:
um espelho pra Medusa 
que é volátil e retrátil... 

Eu me machuco - confesso, 
e cravo as unhas no braço, 
esmurro às vezes, me impeço... 
não sei, mas faço... mas faço... 

5.3.25

Stims VI

Um disco retornável
que mastigo sem fim,
fico ali inalcançável:
Wave, do Tom Jobim. 

Em tempo intraduzível
quando a alma se descola
refugio o indescritível - 
melodias do Cartola! 

4.3.25

Stims V

Descobri pelas pesquisas
sobre neurodivergência,
que etiquetas nas camisas
é a raiz da delinquência...

Outra dose muito forte
é notícia que, na terra, 
etiquetas foram morte
e motivos para a guerra! 

3.3.25

Stims IV

Numerar esses poemas,
em romanos, em esquemas
como inventasse sentido
para o caos comprometido... 

Compor um estratagema
dar fôlego ao barro e tema
e dispor o indefinido
como se fosse concluído... 

8.2.25

Stims III

Ganhei um spinner do meu amor
rodei feliz, que prazer, que prazer! 
Quebrou...

Ganhei outro spinner do meu amor
girei sem parar, sem parar, outra vez
quebrou...

31.1.25

Stims II

Joelho 220 volts,
estilo rock anos 50,
na pontinha dos pés,
o ritmo a gente inventa...

As pernas incansáveis -
os músculos tremulantes,
está tudo bem, tudo bem, 
tudo melhor do que antes... 

Stims I

Defina mãos - 
balance! 
Repita e repita, 
proveite a chance...

Quanto aos olhares
de julgamento,
defina foda-se
nesse momento!