julho 28, 2025

Prenúncio

Se sei que sabes bem? Não subestimo 
total capacidade e raciocínio
em desatar meus nós, mas me lastimo; 
fiquei na mira fácil e por fascínio...

O vento colhe as cores no escrutínio
das pétalas douradas ao vindimo...
E eu fico aqui culpado, sem domínio 
vou me desfalecendo em desarrimo

e lembro de cifrar que a seca finda 
no prenúncio da chuva e da fanfarra
do sol que traz verão, que vibra a linda

canção de mais amar, soror guitarra
tocada de tensão, de dor ainda,
que tende a ser timbrar de uma cigarra...

julho 27, 2025

cyber laziness

luz vermelha
(apaga) 
luz vermelha
(apaga) 

fora de serviço 
         fora de serviço 
fora de serviço 
         fora de serviço 

luz vermelha 
(apaga) 
luz vermelha
(apaga) 

fora de serviço 
         fora de serviço 
fora de serviço 
         fora de serviço 

julho 26, 2025

Carta XII

Falta-me o tato social? Dei agora para empacar com o óbvio. Mesmo mascarada entre bits recursivos, a inaptidão me assombra.

Tenho lido contemporâneos, gente como a gente, com o perdão do bordão classemedista. Daí o ceticismo ficou cínico, esfregando na minha cara que essa solidão foi travestida em vaidade. A solidão me cai tão bem. Desafio-te a descobrir donde roubei isso. 

Outro dia fiquei todo todo. Descobri que Nick Drake chupava também drops de amitril... Aquele girafo e suas túnicas de areia! Sempre tento meter o Nick nas indicações musicais, o Pink Moon é lindíssimo, mas pro inferno os jovens e sua fome de segundos, logo eu, que nunca fui jovem, que ainda peço esmola e pão aos cristãos de Alexandria... 

Acharias incrível como farmacêuticos fazem vista grossa nesse lado do Rio. Hoje fui renovar meus votos no rito pós moderno, consegui duas caixas a mais, mesmo explícita a receita para uma de cada, isso me recorda como maldições psíquicas são cada vez mais nicho especulativo para investimento e acúmulo de capital. "Vai, anedônico, hoje é promoção! Aprende a dormir que nem gente!" 

Outro dia li algo num blog literário daqui, mas de lá da terra de Mário de Sá-Carneiro, vulgo Portugal. O poema repintava, jocoso, sobre a visita de dois Baudelaires. Achei graça demais, mesmo o Brasil não tendo dissabores e mágoas de picuinhas com França.  Sabia que nasci no mesmo dia de Mário? Ah, nossa senhora do simbolismo, ainda não me matei?

Desatei um novelo aleatório. Para o bem do tema central,  era melhor que eu fosse linear, que mais bordarei para te entreter?

Outro dia, pensei que deveria existir uma cartilha para expor nossas linhas de interpretação, minha mutação me impede de perceber nuances no elogio que dou e que recebo, malfeita a genética reduzida ao binário - é literal ou escárnio? Na dúvida, fico com o lógico talvez. 

Ah, minha santinha do antissocialismo! Houvesse uma cartilha para tudo, essa corda do universo seria toda aritmética! E sabemos, (piscadela), que não é, né? 


Há tempos não me escreves, que te fiz eu? Acaso não mereço mais não entender-te?


julho 25, 2025

Esperança

Existe alguma força compulsante
que pode me esmagar um sentimento?
Um rolo compressor, assim, gigante
que planifique a dor deste momento?

Amor? Quando a certeza é delirante 
e faz da voz o embargo mais sedento?
Amor? Quando a paixão é sufocante
e fez arfar meu peito descontento?

Eu tive poucas chances como agora 
e como agora o tempo, que me alcança,
revela que há bem mais, que mais vigora 

enquanto essa paixão perdura e avança —
tão crente que não posso ir embora, 
tão crente que já tive uma Esperança...

julho 24, 2025

Voragens

Que faço se as voragens não me largam?
Reduto da paixão, quanto padeço 
e pago novamente um caro preço
por um papel de versos que te amargam...

Reduto da paixão, me dê teu preço,
um preço para os braços que te largam,
vitrine de sonetos que me amargam
no corte dos pedaços que padeço...

Bonito isso a dúvida, não vês
que tudo se repete ou contradiz
e volta a te dizer mais outra vez

e assim dizendo vai e não prediz
aquilo que produz no que tu vês,
que não dizendo diz o que te diz...

julho 23, 2025

It's so cold

Abre, Inverno, seu corpo retinto,
desaba sobre o vale, romantiza
a tarde que mansinha vem, me pisa
que mais eu tremo, estalo e sinto 

e quebro retalhado, tanto instinto 
me ocorre transversal pela divisa 
e na espinha dorsal se cristaliza,
que a dor me fez melhor e mais distinto...

Rasga, Inverno Cálido, os instantes
que te conheci os olhos conflitantes 
da nova ambiguidade boreal,

que mais avanço e galgo, que te banco
nesse deserto estéril de tão branco,
tão branco quanto a Morte, quanto o Mal...

julho 22, 2025

Flâneur

Há algo. Não durmo. Clico teu perfil,
aumento a foto, pego-me sorrindo
olhando o teu fitar, que me despiu
fitando assim estático, me abrindo 

tão lento e mais que lento, feminil  
e morno me tragando, um trago infindo,
magnético, morno, lento, vil —
itálico, disperso, longe, lindo,

e o nublo olhar me fala, conversamos
sem nos dizer palavra, nos tocamos 
em closes afrontosos e soturnos,

e o anjo olhar me rende, me remove,
embora eu nada tenha que lhe prove,
além de uns decassílabos laburnos...

julho 21, 2025

A Justa

Se sabes, cara dama, deste vate
a quantos anda o pulso, que não meço,
que aqui não há limite, te confesso
que nada disto é amor, mas sim combate!

Contrário a me poupar de todo abate,
desnudo o elmo e a malha, me ofereço
sabendo ser lançado, te obedeço,
e mesmo que tal feito, então, me mate...

Servi-la, que servir é minha sina,
será, por mais complexa a toxina,
melhor que não te ver, não te escutar...

Não sabes como entendo essa fraqueza 
de ser mais desejada que a certeza 
de ter alguém pra quem se declarar...