Cena Pavunense



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No terminal rodoviário uma possível esquizofrênica comia um podrão e bebia guaraná. A cada mordida seus olhos ardiam brasas irreconhecíveis e sua boca abria saída para os mais finos palavrões fragmentados. Tomei nota de algumas novas obscenidades. Contrariado atirei metade do cigarro para não perder o 497 Bom Pastor. Logo chovia. Entrei desajeitadamente ávido. Duas estudantes apontavam lascivas e riam daquela talvez loucura, faziam caretas estúpidas, sofriam de um deboche infantiloide, o que também não é vergonha para seu ninguém, convenhamos. Ao lado, com a testa franzida em clara desaprovação moral, uma gorda embrulhada num vestido vermelho suava em bicas, vez em quando me encarava e balançava a cabeça em uma negação silenciosa, mas eu só pensava em Ki-Suco de morango.
Sentei do lado esquerdo, sozinho. Comi duas bananadas de 50 cents. Porque o mundo, meu amor, não sabe ser justo. Mas não é caso para entrar em parafuso ou ter um ataque de melancolia.


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As árvores estendem
seus longos dedos magros
seguidos de braços hirtos.

As árvores me parecem telas
do mais profundo
desespero dos vencidos...


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Quando penso no amor que idolatro
vem a dúvida do que é a idolatria,
se te adoro como um simulacro,
se te odeio quanto mais se distancia...

É coragem por à prova o contrato
ou tem força a evolução da covardia,
se te amar descubro hoje ser um fato,
se amanhã o mesmo fato assim seria...




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Os velhos versos
nada de novo,
a mesma casca
do mesmo ovo...

As vacas magras
que ainda pastam,
onde os milagres?
nem eles bastam...

Os mesmos muros
fronteiras nuas,
as mesmas dores
as mesmas ruas...

Deitado no campo de papoulas



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O cavaleiro entrega sua cabeça
que trêmulas mãos de castelã abarcam

há silêncio

o tempo julga e decreta

o coração espera novas freguesias
para o comércio de outra miséria itinerante

o grande Mistério é a adoração
pela ciência da primogênita Virtude...


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Deste quintal de putas velhas erguem-se
muralhas farpadas por pseudo-diamantes
e trepadeiras sem flores...

eu sou

A janela escancarada me entornou
na boca do espectro que me habita...




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No fim da rua a tua casa morre
e dormes tão vazia do meu amor,
minha Ofélia melada de obscuros
tristes versos que componho sem pensar...

Consciência e autocrítica



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Sobram-me reticências e vírgulas...
Meu vocabulário é uma vaca carnívora.
À primeira vista minhas ideias são asas,
à segunda são rasas,
à terceira são casas
nas esquinas das fórmulas comprometidas com o uso
do desuso...
Há profundeza nos olhos de quem vê?
No fim
eu sou você,
e vamos mal...

Não entendemos isso de ser poeta profissional.