Shutdown



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Não é como um sentimento isolado. Um desconforto de espinho. Nem a dor de uma resposta sensorial ao tempo. Abro uma cova e enterro o fantoche da circunstância em que me encontrei. Desmembrado em mentiras cotidianas, esquivas emocionais que me garantiram um tempo a mais num ambiente onde o prazer é propor meios para ser violentado. 
Sempre aludindo aos restos, à margem da significância: um quase qualquer. No cativeiro da aleatoriedade cultivo inúmeras questões, no mesmo grupo enumero motivos para sorrir e as origens do universo. O açoite da Questão vai tatuando caminhos vermelhos sobre a pele daquilo que não é a alma, mas é o ter uma alma: talvez a essência plural dos que acreditam. 
Que presunção é exemplificar! Quando toda palavra é somente a intermediária da vontade. 
Seria simplória a resolução do infortúnio se a falta de ter algo fosse apenas a opositora do alívio. O caos torna eterna a realidade que o toca. Tudo é múltiplo.
Já pensei ser a vida o epicentro desse vórtice de insignificância, uma vida que se oculta atrás de uma porta sem chave - cabe a quem inventar essa chave?...
Com minha imagem anti-geométrica tomo assento numa cadeira deslocada do tempo, meu olhar distante procura um vislumbre sempre a frente, enquanto me desfaço rastro de luz, preso a um passado punitivo.
Quem me dera a inércia imaterial do vazio, entretanto, transbordo as probabilidades dos fatos, no mesmo segundo que pretendo o objetivo de um toque, também cogito amputar minhas próprias mãos. 
O que me aflige é a incerteza das coisas. A dúvida primordial, o infinito. Eu, que não posso me calar, que não posso dizer não e me negar a responder. Tenho que me entalhar conforme a norma - madeira pútrida, sem viço. Eu que vivo para significar o que para ti é simplesmente estar vivo.
Eu que sonho nunca ter existido. 

Masking



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Em cada escolha outra tentativa.
No curso frio a probabilidade
de ser suspeita a disparidade 
da nossa falha contraintuitiva...

Como em teu rosto a complexidade
torna-se oculta e contemplativa,
qual é o valor da tua identidade 
mesmo que seja ela punitiva?

Frequentemente esses impostores 
emulam gestos e assumem cores
despercebidos em sua maioria.

E eu controverso e divergente 
só aqui contigo sou transparente:
todo nudez - todo anomalia...

Bioma



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Verdes manhãs, filhas do inverno!
O pássaro compõe, o vento inspira
folheando esse Tolkien sempiterno 
como uns dedos a ferir uma lira...

Sou do triste idílio um subalterno
e da minha toca aponto a minha mira
e disparo ao silêncio e ele terno
dá de ombros, sorri e também suspira...

Oh, velhas deidades circundantes
deste vale onde nós somos amantes -
Montanhas que vigiam o meu coma.

Lentamente transfiguro-me com calma
decompondo minha pele, minha alma
sobre o leito pueril do teu bioma.

Despedido



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O retorno é um jazz fácil.
Suave voz abraça meus sentidos,
deixo o papel de Atlas para outro,
embora tenha os ombros sacudidos.

E dizes: o ruim se queima só.
E penso: tudo é relativo,
estando em Tróia não fui troiano,
como quisesse não estar vivo.

Perco-me no que é real,
mesmo que meus olhos vagos 
tentem, inúteis, decifrar
a propriedade dos afagos.

Mas esses olhos doentes 
que julgam seus movimentos
preferem ver as ondas do mar
onde dorme a alma dos ventos.

Avulsos Atípicos II



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I

Se a paz está no silêncio
abrir a boca é para as feras.
Se a ti minha boca alcançar,
minhas desculpas sinceras!

II

Quem me dera um interruptor
neste circuito de pensamentos!
Disse outra voz entre as emoções 
que aprendi com os desatentos.

III

Ensaio no espelho 
outro "bom dia" normal,
um "boa noite, meu chegado",
mas sempre fica sem sal.

IV

Você não poderá evitar 
o movimento robótico!
Você não poderá refutar 
outro argumento lógico!

V

Sobressaem os negativos 
que tendo a remoer,
por enquanto os positivos 
tendem a se esconder.

VI

O cântico dos sonhos 
ecoa nos místicos 
campos dos Anjos 
ansiolíticos...

Avulsos Atípicos



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I

É sobre mim este poema.
O perfume - WD40.
A consciência um sistema 
operacional dos anos 90.

II

Ando desse jeito
num passo enlatado,
se apresento um defeito
não fico triste, mas enferrujado.

III

Ensaio sorrisos em reflexos.
Será que sou humano?
Tento acompanhar a normalidade 
e esse é todo "Plano".

IV

A dúvida segue meu rastro
calma e constante 
encaro o seu rosto altivo,
incompleto e delirante.

V

Um verso ou melodia 
num ciclo que sempre ecoa,
um gesto que me transborda 
que sempre faço, embora doa. 



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Sempre esteve escrito 
sem entrelinhas, sempre 
esteve por cima dos panos
e nunca deixaste
teu olho vítreo e escuro 
repousar ali.

Sempre esteve fácil 
como a sua própria sombra,
próximo o bastante
feito uma sombra,
tão verdadeiro e falso -
uma sombra...

Sempre esteve impuro 
jogado às três cabeças 
do cão que nos olha de volta 
quando olhamos para o abismo,

Como um brinquedo 
passando de mão em mão
contemplando novos inícios 
de realidades esteve, o Sempre:

O deus, a singularidade, a questão...
O poema rolando a pedra morro acima.

Nem a tristeza ou alegria, nem o mal,
nem os pontos cardeais, nem o bem.

Só o sempre,
seu nome - um verbo 
sendo escrito.

No quadro que pintaste



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No quadro que pintaste 
na tela da tua mente
não sabes, mas trancaste 
a imagem diferente
do que presumo ser.
(E sendo, pouco insisto.)
Traçaste um bem querer 
nos moldes do teu visto.

Bem sei que a arte é falha 
e muita vez se engana 
transforma uma migalha 
numa fartura insana,
porém, minha alma viva,
me causa desconforto 
tua grande expectativa 
sobre este corpo torto...

Disponho, lastimável,
de estranhos arsenais 
beirando o inaceitável,
ao passo que os normais,
com tanta conjectura
tal qual posso inferir,
estão na longe altura 
que não me ouvem rir.

E mesmo assim colores 
a imagem que encarcera 
a antítese das dores 
que o tempo dilacera,
porém, oh bem amada
bendita sempre seja
tua mente que me enquadra,
tua boca que me beija.