Segunda-feira.
Entrei numas de acender fogueira
pra dançar meu ritual de guerra
com os pés descalços
sobre a terra...
Tomei um litro e meio de sangria,
confundi estupidez com rebeldia,
fui ter com os perdidos amizade
e acreditei que existe a liberdade.
Era um dia normal,
ganhei no bicho.
Fiz do que era santo
um capricho,
comi das flores as cores do odor
e o gosto encheu minha boca de torpor,
deitei nesta clareira morna e mística
como um fauno acometido pela tísica,
enfim, um melancólico enojado
de mim, da distância, do planeta, do Estado...
até onde os meus braços vão?
da minha boca o calor se afasta,
em minha mente pensamentos são
emaranhados em espirais doentes...
Terra infértil... abortados brotam
diante da escultura que eu ergui
para o culto dos que se importam...
E arrasto uma memória ruminal
feito inútil e desgraçado animal,
preso numa velha interrogação...
E ciente do que eu não alcanço
ainda sim inconsciente avanço
até meus pés saírem do chão...
dançando entre as nuvens carregadas,
a noite impera... bélicas trovoadas
cravam o estouro de um baque cego...
Eis o vigilante! O Morcego
no alto do edifício entre as gárgulas,
envolto pelo medo tem seu ego
vingativo... humano... cheio de máculas...
Súbito salta e silva, surpreende
o Louco Clown que ri da sua sorte,
dentro da bruma trava-se o combate!...
Enfim, um punho se ergue e acende
a chama circunstancial da morte...
Ele hesita e o Clown grita: "cheque mate!"
Morreu na esquina da Matoso
com a Dr. Satamini,
nada acontece de novo...
Levaram 3 horas, imagine...
A pele negra sob o pano,
A pele branca sob o pano sujo...
Havia também um despacho.
Maldita encruzilhada, aqui
não há blues... não há blues! Eu acho...
A pele negra sob o pano,
era Jesus? Era Jesus!
3 horas... e aqueles passantes
vaga-lumes mórbidos sem luz...
Nada havia, ia acontecendo...
(E quando o vi fui me estremecendo.)
"Era o Zé? Era o Zé!"
Ai dos homens de grande fé!...
3 horas infindas...
o recolheram perto das 11...
Ficando somente o despacho:
vela vermelha, cachaça e rosa...
*
Resvalou-se a turba curiosa
pelo ralo escoador de populacho...
deixo um relicário de almas,
deixo uma noite de calmaria...
Mas exijo! Queimem prosa e poesia!
por mim escoam frias lágrimas celestiais
límpidas e lhanas... Não estou vivo,
nada abala a solidão dos ideais
que na pedra foram eternizados...
Quem há de suportar minha aparência;
aspecto de horríveis gritos dados
em estado de rochosa decadência?
Seis da noite, dobram sinos de bronze,
eu testemunho um crime ao longe... Vejo
amantes encontrarem-se num beijo...
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Nada transpassa o meu degredo frio,
e para sempre cativo silencio...
o ato final de uma vida inteira,
eis que acontece - chega a nova era
e o vento nos espalha em poeira...
Hoje não há "luz que se apaga",
nem uma imagem pobre de matriz,
não há um olhar claro que se alaga,
tão pouco um recital mais infeliz...
Que nome em tua boca vai dormir
silenciosamente resguardado?
Nenhum Caronte vai me conduzir
praquilo que me tem angustiado?
Três dezenas de estrelas reluzentes
que aos risos pelo cosmos fundem átomos...
Quando as vejo - meus olhos transparentes
refletem a minha Ilha de Patmos.
Despido... tribunal... o alarde clama
e crepita em minha pele faiscante,
vem a lembrança de quem me ama
e nada mais que isso é importante...