Hiperfoco



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Então encarno Satã tragando a solitude, 
nas furnas abissais vasculho a rede interna, 
no frenesi de cíclope com fome e rude, 
no engano em ver antiga a maldição moderna...

Intruso é o meu pesar, se penso, logo inflamo, 
enxergo tão somente aquilo que me apraz
e deixo mergulhado na lama a quem amo
pra ter mais uma pétala rara e lilás...

Tomado por tomar-me de assalto eu procuro
mais um outro obter por fim catalogar
na ausência de presente, passado ou futuro...

E enfim, dado o prazer da nova coleção
prevejo da semente o novo germinar 
no beijo decadente da mesma obsessão... 

Woke



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Já é tarde
e meu amor anda entre corredores
espanando a poeira dos livros, 
com seus óculos e maneirismos, 
quando os fios de cabelos entre os lábios
incomodam feito a falta dos meus. 

Já é tarde
e eu sou o ninguém a me escrever
ao som de Blacklash Blues da Nina...

Começou outro ano, marquei médico,
ombro travado...
"eu acredito que alguém colocou um feitiço em mim"
entende, baby?

Já é tarde
e meu amor explode uma hiroshima de cores
e goza comigo nos sonhos
sozinha no banheiro meia luz,
no quarto sob a sombra incógnita
imagina o diâmetro e o centímetro...

E para quando estarei pó e verme
restará a palavra eterna e não oculta:
Eu sou o judeu. 
Eu sou o negro.
Eu sou a lésbica.
Eu sou o gay.
Eu sou cigano.
Eu sou o estrangeiro.
Eu sou o atípico.  
Eu sou a carne pendurada às moscas
e o açougueiro com o queixo sobre as mãos 
e os cotovelos sobre o balcão 
observando o tráfego
enquanto não chega a hora feliz de ir embora.

Rascunho



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Não à rima manjada,
métrica e aliterações,
só carne crua...
Não à rigidez contínua 
dos pontos e vírgulas 
deslocados,
eu me despi do objeto 
substituindo a fantasia do desejo 
de ser...

Eu sou o quase 
na fronteira do vale mortífero,
meus livros?
Não me salvam...
Amigos?
Não confio...
Humano demais para não punir 
meus desafetos infantis 
com o choro do silêncio 
pretensamente imbecil...

A cada instante confundo a lucidez 
cogitando a morte,
a qualquer segundo as árvores dançam o vento 
ritmando a morte,
a velha melodia de um artista adicto
intimando a morte,
as cores de Vincent e o Dante de Dorè
suspirando a morte...

Não ao cigarro e ao álcool 
e a Baudelaire,
não ao voto nulo e a Marx
e à esperança primeira 
da ideia, do conceito 
do rótulo e do fim,
não à utilidade do eu
sombreado pelo capital sedutor...

Eu sou um quase 
entre muitos reincidentes,
revirando cambalhotas 
nas ondas do tempo pérola 
onde como ele - mar,
quase também não existo.

Status



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Meus pontos de vida aflitivos
num pixel mágico delirante...
Em minha defesa protestante
invoquei escudos primitivos,

evito os danos consecutivos,
mas até quando? o turno avança 
enquanto o meu ataque não te alcança
na terra dos feitos punitivos,

embora evasiva a condição,
calculo os meus pontos de ação 
no lance mordaz de um dado místico,

e o dano, como o arco da paixão
contundente quebra o coração 
e acerta o malogrado erro crítico!...

Sensorial



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Há qualquer coisa em mim 
que se debate
e convulsa alienada 
quando o mercado está cheio...

Não vejo os preços, só as luzes
e todo esse tiroteio de vozes,
esses lança-rojões 
na sessão de frutas e verduras...

Tem muito cheiro,
variedades de desinfetantes...
Tem muita carne
e há algo podre no úmido escondido...
Tem muita gente
que sorri intuitivamente...

Minhas mãos gesticulam
embora eu tente reprimi-las,
só há oxigênio lá fora
na calçada dos desafogados...

Brutalismo



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Elegante monocromo
erguido por mão futura, 
eu me me pergunto - como
foi feita a arquitetura
tão mínima e tão tônica - 
faixada de nuvens gris
falsa e babilônica, 
altiva imperatriz. 

Erro por teus andares, 
procuro meus iguais, 
procuro por Antares
nos sinos das catedrais...
E teu timbre grave soa
um fá sustenido lento... 
E o desejo, embora doa, 
é levado pelo vento... 

Avulsos Atípicos (Hard Version)



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I

Vermelho o grito medonho 
insulta a deus, é um sonho
sumir diante do absoluto 
sem fim, sem adeus, sem luto...

II

Há meses um npc 
de survival horror...
quem me dera você
soubesse me impor

qualquer comando -
algo mais, um sentido
nesse quando em quando 
nunca concluído.

III

Mesmo a ausência 
torna-se incompleta -
a vida é uma evidência 
de uma falta abjeta.

IV

Até quando levar as mãos à fronte,
afundar o crânio entre dez dedos,
na procura infantil alucinar o horizonte 
no furor inalcançável dos segredos?

V

Será você, leitor, o Anjo da morte
no deleite dessas vicissitudes,
será o meu amor, minha consorte 
no mistério dessas amplitudes?

VI

Salve, Abramelin!... Adramelech,
maldito o arco-íris do teu plasma!
Ah, não importa quanto eu peque 
sempre há mais narina pra miasma!

VII

Já já a boca nunca mais diz...
Já já não sobra um relato...
Já já não será mais o infeliz 
que em vida vive putrefato...

Hikikomori



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Olhos abertos, outro dia sem rosto
sorrindo sépia sempre compassivo
ao discutir sobre o competitivo
capital nulo que nos será imposto.

Aristocrata o Sol - um rei deposto, 
não tem nenhum decreto conclusivo
sobre o não ser ou ser improdutivo, 
mesmo completamente decomposto...

Sair de ti à luz? Que superestimado
esse convívio humano quando é dado
ao mal comum - disfarce de empatia.

Sair de ti é luz, desse quarto apagado
planejo o não viver obcecado
por outra novidade ou nostalgia...