16 julho 2025

Eu não-lírico

Não confie no meu eu não-lírico, 
que ele não te revela o presente, 
que ele não finge, não mente,
que ele não é.

Não confie no meu eu não-lírico, 
que ele dorme, erra, faz-não-faz,
que ele teme aproximar-se demais
do que ele é.

Ai, meu eu não-lírico vai longe
buscar o dicionário, o dicionário!...
Tropeça — unha encravada — caralho!
que dor! 

Ah, esse meu eu não-lírico, garoto
míope! anedônico! presunçoso!
carne, finito, parco, meloso
de amor...

15 julho 2025

Stims XVII

Nem melancolia, nem destempero, nem medida
por algum fio... 
Divago ânsias em órbita do abismo mais denso 
de tão vazio... 

Cansei de maldizer o dia que vim a nascer... 
num maio frio  
o Outono a me balançar cantigas no berço —
num tom sombrio... 

14 julho 2025

notas para o sobrado/gato

tubo de 40
4 joelhos de 40
tubo de 20
8 joelhos de 20
teflon 
cola tubo

2 metros de areia 
2 metros de areola
2 metros de brita n° 2

36 sacos de cimento 
10 sacos de graffilito
1500 tijolos de 30
500 tijolos de 20

cabo 10,0mm duplex 
neutro isolado
50 metros
4 conectores perfurantes
entrada de 70 saída de 10
duas alças
caso seja possível
aproveitar alguma alça do poste

13 julho 2025

O Programador

Acorda Deus, é sábado, vem para fora 
do cobertor Nirvana... presto, seja vivo! 
recola um retrô pôster bem figurativo
no Teu quarto de caos, de estática! Vambora! 

Põe Teus chinelos, verba a Voz, acende o Agora, 
flanela o curvo óculos definitivo, 
encontra em existir Teu cínico motivo, 
dichava Teu badego, vem Nossa Senhora!...

Pois liga o Teu PC que, singular, explode
num boot tão veloz, que distorcendo a luz
imagifica o Tudo com Seu hack mode, 

também vê Teus recados de orações em flux, 
enquanto clica a Terra, e pensa no bigode
do próximo avatar com nome de Jesus!...

12 julho 2025

Carta X

Vem, sumo de caju, conversemos sobre aquilo. 
Eu disse te amar crendo proferir um encantamento medieval, um desejo de que o mundo físico se modificasse, tenho a meu lado o fato neurológico que explica: gente jovem faz merda, fizemos. Era ou não era alquimia? 
Seremos francos, aquele teatro infantil machucou a nós três, que protagonistas amadores! (Aqui, esqueci da quarta criatura, a do teu lado). Dediquei-te sonetos, espremi-te cravos e espinhas da alma, pesquisei-te o custo benéfico das juras, dos modismos contraculturais, dos romances dúbios, apoiei-te quando a tarde veio te apertar num canto. Vê lá, que poemas imensos cheios de erros gramaticais, de miopias e astigmatismos sintáticos, mãos ansiosas em conquistar-te ideal, a mais platônica das patologias... 
Longe de mim me eximir do conceito da culpa, mas na real, me perdoe, eu menti. E nos mentimos. Como bem disseste – nós. 
Não existe amor sem cumplicidade, sem aquela partilha de dor fúnebre ou riso escandaloso de piada duvidosa, sem o verme do bico de um para o outro, como, naturalmente, comem os bucólicos passarinhos. Veja que o exemplo que tive foi o dos meus pais - putz! 
Bem, como todo poeta... não, pera, não serei um canalha desse tipo, mas doutro! Errei e ponto. Penso ter acabado lá, mas talvez eu tenha deixado alguma semente murcha, que brotou uma flor moribunda, que te perfuma com os vapores de Delfos, deixando claro a alusão a algo entorpecente e nocivo. 
Olha, com todo respeito, mate esta flor dos infernos!
Agora, sabendo do peso da sua cruz, exponho-nos, deliberadamente. E digo para não dizer o oculto, aquilo que bem sabes. 
E tu, que chegas por aqui de soslaio, sabes de tudo, insuspeito leitor. Nós não. 
Pense, naquela época acontecia a revolução dos smartphones. 

11 julho 2025

arno extreme force breeze poetry

vol 1

leve zéfiro ameaça levantar a página de "uma estadia no inferno e iluminuras" suave baforeja na pele o carinho intermitente e causa sono

vol 2

já espanta mosca já refresca já se supõe que as oito pás enterram um mormaço morno porém naturalmente o meio termo nunca é tido como opção

vol 3

potência de existir que esgota a força o sentido a vontade que regela e se faz presente no desejo da maioria que respira a meta total da vitória 

desl

mudez descanso (in)finito

10 julho 2025

XV Os pássaros

No meu dissimular de déjà vu, 
tentei justificar um vaticino, 
onde retorcia um homem-bem-te-vi 
de dor sobre a soleira, ao sol a pino, 

tomei teu corpo pobre, e me atrevi 
cuidar-te as asas quedas de menino, 
depois dei-te ao biquinho, que previ 
tomar de toda boca algo ferino, 

a carne do meu pão recém partido, 
o sangue que um milagre fez ungido 
por tantos passarinhos machucados, 

e a mim? não resta mais que ver partir, 
assim como chegaste, podes ir, 
agora que não tens pra que cuidados... 

09 julho 2025

social ability killer

no eyes no look
can't move can't see
  this is a thing
this is a situation for me

no eyes no look
can't love but can hate
  I can so much so far
  I can die and die and putrefy
can you feel me a natural reflex?
can't cry like human and confess

no mouth no voice
can't suffer from suffering
  bullet my honey eyes
  bullet my alien soul
we're dying just to lies 
there's no more shining
and green and white and nothing