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1


Os dias tristes nascem
do marulho dentro das conchas -
a pretensão de um oceano grandioso
dentro de uma frágil porcelana oca...

2


Os dias tristes estão
para o suicídio
como a Quinta da Boa Vista
está para o cuspe e o mijo...

3


Minha última refeição
quero comê-la no arrojo
de uma transubstanciação
de toda matéria em Miojo...

4


Os dias não chegam tristes,
vão pouco a pouco emurchecendo.
Quando sentimos um calafrio
sabemos, está acontecendo...

5


Não te guardo mágoa alguma,
não és capaz de me ferir
com sua queixa que exuma
minha pouca vontade de rir...

6


Os dias tristes são como sonhos,
como sonhos mal concebidos,
vêm assombrar-nos, enfadonhos,
como filhos mal concebidos...

7


Há quanta mudança nas horas?
a tristeza não dura um minuto...
Enquanto florescem amoras
estrelas estão de luto....

A cela



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*para uma HQ do Alan Moore

Respiro. A cela toda ao redor. Desenho sol e nuvens nas paredes úmidas, redefino ideias de júbilo. Fantásticos sons exteriores me fazem perceber todo meu estado equívoco. Enfio a cara entre as grades, penso em socorro, em morte. Tenho paciência. Súbito, rompo com todas as meditações, sobretudo as que me dão esperança; esse caminho onde se visa o fim das coisas. Mas, que fim? Sempre outra sentença principia, torna a ampulheta vagarosa a trabalhar contínua, irrefutável. 

Fumo. Tenho na sombra um adversário, 
desfiro baforadas, provoco-o...
Estarei louco? Examino meus dedos...
Estou completamente oco... oco!


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Todo poema é inútil

todo poeta é um mala
entre os males mais raros

Todo poema tem sido inútil?

alarde de sinos
faróis de carros


No trem



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Ela folheava sensualmente aquele livro. Tinha uma cara de espanto e graça, suas sobrancelhas exclamavam uma muda interjeição. O título de um sarcasmo fodido: "Ser Homem", sem aspas...


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O tempo seco acampou em minha voz
uma trupe de ciganos catarrentos...

O Puro



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Na altura de Pilares entra no vagão um sujeito composto de cigarro e cana.


Belford Roxo



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...faz calor de manhã em Belford Roxo,
quarta estranha e sem luz, o sol vem coxo
remando atrás das nuvens, que grisalhas 
são para o grande azul como mortalhas...

As conduções são quartos ambulantes
repletas de envolvidos em sudários,
o asfalto todo falho de alarmantes
indícios dos descasos partidários...

No mais, há de haver vida na baixada,
embora mais distante e aturdida;
mulher abandonada pobre e grávida,

que tendo a humanidade esmagada,
na lida de ser só encontra alento
e faz da própria dor alumbramento.


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Engraçado recorrer ao assunto da morte,
quando até no meu nome há o deboche da vida.