02 junho 2025

CEP 20785-080

Passei dos 16 aos 22
por alguns números
na rua Álvares de Azevedo, 
da fábrica Chinezinho, 
da casa de minha tia Jô 
e do meu amor morena, 
da travessia para a escola Rio de Janeiro 
para o postinho da Xuxa... 

Naquela época era impossível 
compreender minha própria lira. 

Na aula de literatura brasileira 
sobre o Mal do Século, 
no presídio-escola Delfim Moreira, 
percebi que eu era aquela rua
e decidi assim rotular meu verso 
por falta da concepção de estética, 
encantado com a tragédia do nome 
daquela rua, daquele poeta 
que eu queria ser, que já era, 
também eu tinha tanta tragédia... 

Naquela época só era possível
compreender minha própria ira. 

01 junho 2025

Avulsos Atípicos VIII

I

Abstraio longamente os instantes com minha raquete eletrônica, 
produzindo estalidos faiscantes da mosca mais antagônica. 

II

Carma ruim. Voltarei mosca
e não haverá mais sopa
para meu esporte olímpico... 

Outra ideia tem sido uma fosca
rima aberrante que tropa
num dobro de passo cínico...

III

O SUS é tipo um cassino, 
que acaso a casa se distraia, 
nós conseguimos destino 
com os outros da nossa laia. 

IV

Ai, que me consterna um odor, 
se aquele me tange à memória, 
e chapo aboletado na cor, 
se dela confesso uma história... 

V

Uma semana antes viro helminto 
trançado num casulo biliar, 
na espera infernal que pressinto 
que algo inda vai me chegar. 

Me ferve do estômago o domo, 
não há Sonrisal que combata
com força essa ânsia que como, 
que não me abandona, nem mata. 

VI

Noutra das minhas vidas 
onde um gerente da Adidas 
me julgava para o tronco, 

gestei da dúvida, em suma, 
se ir com meu grunge Puma
dava ares de ser bronco, 

foi prodígio de surpresa
que ninguém naquela mesa
perguntasse sobre a afronta, 

que fingi por simpatia 
que meu tênis nem sabia 
da piada quase pronta. 

VII

Queria nascer, simplesmente, 
e não me entender por nascido, 
trocar o arcabouço da mente 
por qualquer lodaçal curtido,

caçar na savana ou na neve, 
ter prole, um ninho, uma toca
e nunca reter nem de leve
mais nada que verba e provoca... 

31 maio 2025

Carta III

Que esta lhe encontre em boa saúde. Trago as novidades de Eros, as palavras práticas dos delírios mais joviais. Minha voz inelegível procura um intérprete para velhas alucinações, arrasto o dorso pelo charco das indagações, mordido, amotinado. Subo mesas de praça e declamo novos salmos aos trabalhadores urbanos, sequestro coretos, assombro gangorras e balanços, corro os dedos pelas grades que circundam tantos edifícios, me enojo de poeira, fuligem, de gente... 
Que delicadeza, não é? Não há escrúpulo em se esconder por trás dessas miragens cômicas, porém tomo um gole a mais, embriago, a mesa não pertence à Realidade. 
Beijarei outra vez teus cabelos, Solidão? Outro soneto para quem, a Morte? Vambora que lá vem o trem! 
Eis outra era. Erguem-se novas divindades com seus pilares bijuterizados de estrelas sobre o tecido multicor das horas, seus olhos quasares lacrimejantes plasmáticos, nordestinos, risonhos, indiferentes ao significado do nosso medo, da ebulição do desejo, do cio, do cheiro dos sexos. 
Olha o assombro das potências exponenciais escravo  de um verso, enquanto derramado todo estupidez sobre alabastro dos seus... 
Neste trânsito insisto na expulsão da alma, convoco a magia espalhando essências tribais. Estendo os dedos vencidos pelo vazio deixado por seus lábios. Rogo a ti, que não és teu corpo, mas um universo em expansão, um infinito passível de toque, vivo. 
Espero agradar com esta performance, não seria possível dizer-te apenas que... 
 
Mande notícias, meu Maná. Eu tenho fome.

30 maio 2025

A consulta

Neste quarto que o sol nunca quer,
mudas mãos nervosas nos mostravam 
a matiz roxa que aos lábios davam,
uma dor de arfar o rosicler...

Os vazios venciam cheios de quaisquer
fractais atróficos que inchavam,
pela vida que testemunhavam 
a metástase entre homem e mulher...

"Dor no peito?" Diz o frio doutor. 
"Vai ter jeito?" O interlocutor,
ajeitando as bordas do vestido

que de flores em fundo pastel 
perfumava suas dores no céu,
onde o sol não devia ser erguido...

29 maio 2025

títulos variados para poemas cariocas

comando vermelho 
vila mimosa 
vômito no garage 
a braba do jacaré 
fogo no 298
fecha o brizolão 
churrasco de x9
funk proibidão 
buraco do lacerda
ode ao fogueteiro
de bonde pra praia
o que significa apologia 
de ak 47 e de glock 
no gogó da ema
a crise do prensado 
feira de acari
beijo na passarela do nova américa 
bangu de dante
narcocultura propagada 
pó de 20
me enterre em inhaúma 
já é 

para notas antiTDAH

edição de notas mentais 
esqueleto poético 
mosaico sináptico 
ordem sobre caos 
salvo em nuvem 
motivo para outra tag 
impulso do vício em listar coisas subjetivas 
padrão de caixa baixa
pontuação nula 
evitar o lirismo a metáfora o humor a metalinguagem 
evitar modificar as notas originais 
evitar expor notas comprometedoras e sexuais 
evitar o cinismo 
acenar para o interlocutor de soslaio

XIII

Aqui deste ocultismo em carne viva
confesso doutra boca o meu desvelo, 
portanto mais vulgar do choque ao pelo
na pele metamorfa e permissiva... 

Nem sangue vence aquela que cativa 
nas tranças ancestrais o pesadelo, 
que dói como se a dor não fosse vê-lo 
distante dentro em outra dissertiva. 

A Lilith urbana não se afeta, 
quando ama se derrama por completa, 
até se transbordar ou se exaurir, 

da estrela do ocultismo te convoco, 
servida dos espasmos que provoco, 
até chegar aos céus e transgredir!...

28 maio 2025

VII A Sukeban

Em gangues hemorrágicas se infestam
nos bares dos pretensos monarquistas, 
empunhando suas bokkens entre saias
que longas contornavam toda fúria, 

furavam olhos bêbados, patriarcas 
da tradição nipônica do estupro, 
que gritam reduzidos às suas presas
agonizantes, velhos bem surrados! 

O crime de uniforme feminino;
a violenta rosa mais que o choque
engendra o roubo e a prática do estilo

que curva de joelhos mesmo a vida, 
que finca, que desmembra, que incendeia, 
que não se submete e nem acata...