22 de fev. de 2023

Mediano. Nada incomum 
numa vala, numa cova 
e ali soterrado de mim
creio que tudo se renova,

porém nada muda, nada...
O que será que eu aprendi?
De que tanto eu me cobrei?
E o quanto me arrependi?

Que mal, Davi. Que ruim.
Eu me julgo tão doente 
e enganado por qualquer
espectativa e simplesmente 

acabo nessa, nesse foço
aturdido e mediano 
sempre um autosabotado
afeito ao desengano.

18 de fev. de 2023

O sol nascente ao longe 

traz perto as dimensões 

da nova manhã


O sol é esperança - não tarda 

a beijar os nossos olhos 

com tanto afã


E eu que pouco sonho 

permito à minha alma 

a dança - a canção 


E eu que nunca canso 

entrego o tudo e o nada 

de coração


2 de fev. de 2023

Chevra Kadisha

Teus olhos que me abriram buscando tal essência
reconhecida em velhas palavras de espírito,
do recôndito da alma ou eterna dissidência -
teus olhos duas Antares de força e conflito.

Atados pela carne ou pela decadência 
meus ossos encontraste em tudo que foi dito,
em tudo que se enterra por zelo ou influência
da urgência de ser único, mas indescrito.

E como julguei etérea, dessignificada
a origem destas ermas e incautas imagens
na oculta sordidez erguendo suas paragens!

Teus olhos que banharam essa terra ilhada,
afeitos ao meu corpo - comum subserviente
deste rito sagrado e contraproducente.

*

Eclesiastes 5:16

"Há também outro mal, assim esteja atento:
nossa nudez é igual na volta ou na partida,
que vale perseguir o rastro vão do vento
e entregar para o tempo os valores da vida?"



Toda palavra foi comprimida
dentro de uma sentença reduzida
a uma descrença desequilibrada,
toda letra foi lida e pronunciada,
tudo que é sonoro foi soado 
e o que se deu ao uso foi usado.
Toda tristeza é hereditária 
e essa saudade latifundiária
do que nunca foi verdadeiro e meu,
eu acho que nem mesmo aconteceu 
o anoso mistério que foi revelado 
do que era evidente e significado. 
Tudo que é dor é indiferente 
à delicadeza do amor contundente,
e o líquido amparo da alma é inútil,
nem mesmo a poesia pouco sutil
te diz o que é teu e então te conduz
a qualquer ímpeto de morte ou de luz.
E tudo regido pelo discernimento
se mistura e se funde ao conhecimento,
nada mais é firme aos pés cambaleantes 
e nem mesmo a jura eterna dos amantes
pode enfim traduzir da língua mais ufana
o horror de pertencer à espécie humana.